Nove em cada dez adolescentes que tentam comprar cigarros não são impedidos atualmente no Brasil. Além disso, a grande maioria (cerca de 70%) desses jovens faz isto com frequência e em estabelecimentos comerciais autorizados. É o que aponta estudo de pesquisadores do Instituto Nacional de Câncer (INCA), publicado na sexta-feira (3) na revista “Cadernos de Saúde Pública”.
Ao comparar dados das últimas duas edições da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar – de 2015 e 2019 – os resultados também mostram que a proporção da falta de cumprimento da lei que proíbe a venda de cigarros para pessoas com menos de 18 anos se manteve igual nos últimos anos, estagnada em um patamar bastante elevado.
Há também indícios de uma “dupla ilegalidade”: na maioria das vezes, as compras são realizadas em estabelecimentos comerciais autorizados (como bancas de jornal, cafés, mercados, padarias, banca de jornal ao invés de em comércio ambulante) e envolvem a venda de cigarros avulsos (ao invés de maços) – que por si só também é proibido, independentemente da idade do consumidor.
“Esse ciclo de retroalimentação da ilegalidade aponta para a baixa efetividade de determinadas leis de combate ao tabagismo, o que contribui para o enfraquecimento da política nacional de controle do tabaco”, ressalta o doutor em Saúde Pública André Szklo, autor do estudo ao lado da estatística e doutora em Epidemiologia, Neilane Bertoni. André Szklo lamenta que o cigarro no Brasil seja o segundo mais barato da região das Américas, atrás somente do Paraguai o que, somado ao fato de que os produtos recebem aditivos de sabor e aroma, “faz com que o produto se torne ainda mais atraente para o jovem buscar adquiri-lo”, reforça.
Estudos como esse, afirmam os autores, estão entre aqueles que compõem o sistema de monitoramento da epidemia do tabagismo no Brasil e que servem para auxiliar na efetiva implementação da Política Nacional de Controle ao Tabaco. A preocupação, além do sofrimento causado pelas mortes diárias de 443 pessoas por causa do tabagismo e da saúde de jovens que se iniciam e desenvolvem dependência do tabaco, é também com os custos decorrentes dessa epidemia: “O tabagismo acarreta um custo econômico e social com sistema de saúde, perda de produtividade e cuidados com familiares, de 125 bilhões de reais por ano”, quantifica Szklo.
“Então, além da perda das pessoas, do sofrimento causado e da dependência, isso significa um custo para o país muito superior ao quanto se arrecada com impostos – o imposto só cobre 10% desse gasto. Na verdade, a indústria não está cobrindo os gastos para a sociedade e esse é um dinheiro que poderia estar sendo investido em educação e saúde, por exemplo. Considerando, ainda, que aproximadamente 2 em cada 3 usuários de produtos derivados do tabaco virão a falecer no país em decorrência desse comportamento, a reposição desses usuários pela futura geração de jovens e adolescentes brasileiros levanta uma enorme preocupação. É nisso que esse artigo acaba chegando”, conclui o autor.