19/12/2020 às 09h14min - Atualizada em 19/12/2020 às 09h14min

Desembargador revê decisão e desautoriza retorno de prefeitos presos na Reciclagem ao cargo

Gazeta Rondônia

Após revogar as prisões dos prefeitos acusados de receber propina de um empresário do ramo de coleta de lixo, e determinar o retorno dos acusados aos cargos, o desembargador Roosevelt Queiroz, relator do caso no Tribunal de Justiça, reviu sua decisão e revogou o retorno ao cargo, mantendo apenas a liberdade.
 
O magistrado ponderou que os cargos já estão ocupados, e resta praticamente duas semanas para o fim dos mandatos, portanto não vê sentido no retorno às funções públicas. O desembargador pontuou:


“Em verdade, verifica-se risco à instrução criminal o retorno da Prefeita (Glaucione Rodrigues) denunciada pelo crime de concussão à Prefeitura de Cacoal no fim de seu mandato, pois levanta a suspeita de que ela queira retornar aos prédios públicos para coagir testemunhas e se livrar de provas”.

Veja abaixo a íntegra da segunda decisão do desembargador:

VEJAM A NOVA DECISÃO: 

DESPACHO DO RELATOR 
 
Pedido de Prisão Preventiva 
Número do Processo : 0002211-25.2020.8.22.0000 
 
Requerente: Delegacia de Policia Federal Em Ji-paraná/ Ro 
 
Relator: Des. Roosevelt Queiroz Costa 
 
Vistos. Nesta mesma data, avoco os autos conclusos para proferir decisão retificadora. Em deliberação imediatamente anterior, ponderei pela revogação das prisões domiciliares dos investigados, assim como da suspensão do exercício de suas funções públicas, permitindo a eles o acesso as dependências dos prédios públicos do Executivo municipal de cada localidade.

Contudo, após exarar a decisão e relendo várias vezes os autos, restei convencido, em tempo, de não ser possível os retornos aos cargos de prefeitos. 
 
Explico: 

Primeiro: a prisão preventiva foi por mim convolada em custódia domiciliar, cujas regras foram corrigidas, há menos de um mês, há apenas duas semanas atrás, especificamente, não sobrevindo, desde aquela deliberação, qualquer alteração fática. 

Segundo: na apuração de datas, a suspensão do exercício da função pública foi decretada em 14/9/2020 e cumprida em 28/9/2020 com a intimação do Presidente da Câmara Legislativa de Cacoal, razão pela qual a suspensão vigorará até 25/1/2020, quando já terá ocorrido a posse de novo prefeito. 

Aliás, acaso se tivesse adotado o próprio prazo reclamado pelo Órgão ministerial, de noventa dias, ainda assim o prazo não estaria expirado. 

Terceiro: a investigada foi afastada com o fim de garantir a ordem pública e social, uma vez que, de forma reiterada, vinha se valendo do cargo de prefeita para exigir vantagem indevida de empresário que mantinha (ou ainda mantém!) contratos com a Administração local, sendo indevido, neste momento, o retorno ao cenário em que cometido o crime, registrado por meio de imagens pela Polícia Federal. 

Ademais disso, o fato de a fase pré-processual ter se encerrado, com o oferecimento da denúncia, não significa que se tornou inócua e sem efeito as medidas cautelares, pois podem ser decretadas e mantidas em fase judicial, em que um novo estágio se inicia e com produção de novas provas, agora sob o crivo do contraditório. 

Não por menos o próprio Código de Processo Penal prevê expressamente a hipótese de aplicação de medidas cautelares, seja de prisão ou diversa dela, na fase da “instrução criminal”. 

Em acréscimo e pela suficiência, transcrevo apenas parte do parecer ministerial e que se orientou dessa forma acerca da contemporaneidade dos fatos: 

Destaca-se que os fatos são contemporâneos às medidas aplicadas, pois as condutas criminosas só foram interrompidas por intervenção do Poder Judiciário, havendo curtíssimo espaço de tempo entre os fatos e o pedido agora apresentado pela Prefeita para voltar a atuar como Chefe do Poder Executivo Municipal. 

O tempo transcorrido não foi sequer suficiente para apagar da memória da população rondoniense as imagens da Prefeita GLAUCIONE recebendo “propina”, as quais foram noticiadas em rede nacional de televisão! Portanto, permitir que a Prefeita volte ao cargo em tão pouco tempo é afronta ao sossego social e à credibilidade das instituições. 

No ponto, é bom destacar que a requerente não foi reeleita para o cargo público e deixará de ser Prefeita em 01/01/2021, o que significa dizer que, caso o pedido fosse deferido, ela exerceria a função por um período de tempo menor que duas semanas e, considerando que é mês de dezembro, os trabalhos estão sendo realizados prioritariamente em regime de home office por causa da pandemia de coronavírus, não se vislumbra nenhum benefício para a Administração Pública o retorno da Prefeita afastada

Em verdade, verifica-se risco à instrução criminal o retorno da Prefeita denunciada pelo crime de concussão à Prefeitura de Cacoal no fim de seu mandato, pois levanta a suspeita de que ela queira retornar aos prédios públicos para coagir testemunhas e se livrar de provas. 

A alegação de que pretende voltar ao cargo para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal em relação à prestação de contas de seu mandato não é motivo idôneo para garantir seu retorno à cena do crime de concussão, haja vista que a prestação de contas pode ser realizada pelo Vice-prefeito ou quem estiver ocupando o cargo de forma legítima. (destacado e sublinhado no original) 

Revendo os termos em que se deram os afastamentos das funções públicas e a exiguidade do prazo que restaria de mandato popular de cada qual (menos de duas semanas, sem contar o período de recesso nos órgãos públicos), devo retificar novamente, em tempo , minha posição. 

A Carta Federal prevê que haverá um vice-prefeito para cada prefeito (art. 29, I) justamente para garantir a continuidade do mandato e da gestão administrativa da máquina pública. 

Assim sendo, não há nenhuma necessidade da investigada Glaucione retornar ao exercício do poder, tendo acesso irrestrito ao maquinário, documentos e o próprio pessoal que compõe o Executivo local. 

Nesse entender é a doutrina de RENATO BRASILEIRO: 

A medida cautelar do art. 319, VI, do CPP, somente poderá recair sobre o agente que tiver se aproveitado de suas funções públicas ou de sua atividade de natureza econômica ou financeira para a prática do delito, ou seja, deve haver um nexo funcional entre a prática do delito e a atividade funcional desenvolvida pelo agente. 


O periculum libertatis, por seu turno, deve se basear em fundamentação que demonstre que a manutenção do agente no exercício de tal função ou atividade servirá como estímulo para a reiteração delituosa.
[...]  Assim, da mesma forma que a suspensão do exercício da função pode ser determinada para evitar novas práticas delituosas, a medida também pode ser imposta para que o acusado não se utilize de suas funções para destruir provas, pressionar testemunhas, intimidar vítimas, ou seja, para obstruir a investigação de qualquer forma ou prejudicar a busca da verdade. Portanto, apensar de o art. 319, VI, fazer menção à suspensão apenas para evitar a prática de novas infrações, é evidente que o agente também poderá ser suspenso para garantia da investigação ou instrução criminal. 

(in Manual de processo penal: volume único 5. ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. JusPodivm, 2017, p. 1.037-8, destacado). 

Com essa nova perspectiva, compreendo que devo reparar equívoco cometido na avaliação dos fatos apresentados, o que faço a seguir. 

I DISPOSITIVO E DETERMINAÇÕES 

Em face do exposto, com as considerações acima: 

a) mantido fica o deferimento do pedido de revogação de prisão domiciliar, que fica estendido a todos os investigados o benefício; 

b) em retificação a decisão anterior, indefiro o pedido de revogação da suspensão do exercício da função pública (de prefeita), permanecendo a proibição de acesso ou frequência à Prefeitura local e seus demais órgãos diretos ou indiretos; 

b.1) nesse item, em relação aos demais investigados, não vindo pedido próprio, revogada fica a determinação anterior de extensão dos efeitos, agora reavaliados; 

b.2) acaso já tenha ocorrido a comunicação das respectivas Câmaras Legislativas de cada municipalidade e do Tribunal Regional Eleitoral de Rondônia da decisão anterior, expeça, desta, nova; 

c) ficam todos os investigados obrigados a comparecer em juízo sempre quando for intimado(a) para tal (poderá ser expedida carta de ordem para o cumprimento desse item, oportunamente); 

d) ficam todos os investigados, outrossim, proibidos de manter contato com os demais investigados do IP n.º 0005822-20.2019.8.22.0000, assim como com o colaborador do feito, seja pessoalmente ou virtualmente, ainda que por interposta pessoa; 

d.1) em relação aos investigados Daniel Neri de Oliveira e Glaucione Maria Rodrigues Neri, considerando que são marido e mulher (cônjuges), fica excepcionado o impedimento de suas comunicações (exceção ao Item retro);  

e) no mais, mantidas as demais deliberações, que devem ser cumpridas como lançadas pela i. Coordenadora. 

II DELIBERAÇÕES FINAIS 

a) intimem-se todos desta deliberação (PGJ e Defesas); 

b) oficie-se o e. Min. Joel Ilan Paciornik, do egrégio Superior Tribunal de Justiça, desta decisão, relator dos HC's 616.618, 616.749, 616.750, 617.209 e 622.806, enviando-lhe cópia; 

c) cumpra-se em regime de plantão, servindo esta como MANDADO/OFÍCIO para as comunicações que se fizerem necessárias. 

Diligências legais. 

Porto Velho/RO, 18 de dezembro de 2020, às 21h36. 

Desembargador Roosevelt Queiroz Costa Relator
 
Fonte: PainelPolítico - com informações do BlogdoCarlosCaldeira.


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