Um cavaleiro morreu e chegou montado em seu cavalo a um lugar que supôs ser o céu.
O porteiro do local foi enfático:
– Você pode entrar, mas tem que deixar o cavalo do lado de fora.
Ao ouvir isso, o cavaleiro decidiu não entrar.
E começou a cavalgar até encontrar outra entrada.
No portão seguinte, o cavaleiro perguntou ao porteiro.
– Posso entrar com o meu cavalo?
– Sim, pode. Aqui é o céu. Seja bem-vindo!
– Mas, se aqui é o céu, lá atrás era o quê? – perguntou o cavaleiro.
– Lá era o inferno, onde entram aqueles que abandonam os melhores amigos – respondeu o porteiro.
Esta história é uma lenda. Mas é uma lenda que dá sentido à história da relação entre o ser humano e o cavalo.
Nos primeiros tempos, o animal serviu inicialmente de alimento – assim como ocorrem ainda em algumas partes do mundo.
Depois, foi utilizado no transporte, nas guerras, na agricultura, e, mais, recentemente em atividades esportivas, lazer e em processos de recuperação física e psicológica de pessoas.
Assim como nos tempos mais remotos, o cavalo ainda simboliza poder, liberdade e triunfo, pois sempre os vencedores de batalhas chegavam para receber suas honrarias montados em seus mais importantes cavalos.
Sempre existiu e existe um acentuado companheirismo e cumplicidade entre o ser humano e o animal, aspecto que ainda perdura de modo evidente e geral.
A história já presenciou o fato de um cavalo ser nomeado cônsul de Roma por seu dono, o imperador Calígula, e marcou época o cavalo Bucéfalo, pertencente ao grande imperador Alexandre o Grande.
A raça mais antiga conhecida é o puro-sangue árabe, que inclusive deu origem a muitas outras.
Hoje em dia, o cavalo, mesmo com outras finalidades, mantém aceso o seu vínculo e importância para o homem, tendo dado origem a muitos livros, romances, filmes que emocionam, pois trata-se de um animal sensível, dócil, e companheiro. Em tempos mais recentes, o filme “O Domador de Cavalos” e a serie canadense “Heartland” abordam com muita riqueza esta relação, que enobrece o caráter, gera e preserva valores.
Diz a crendice popular que aquele que se afeiçoa pelos cavalos faz aflorar qualidades positivas, aprimora suas características emotivas e de solidariedade.
Seja nos rodeios, nos desfiles, nas vaquejadas, nas competições olímpicas, nas caças, nas demonstrações acrobáticas, os cavalos prendem a atenção de adultos e crianças.
A equoterapia (terapia usando cavalos) hoje já é consagrada como processo útil e eficiente na recuperação de inúmeros traumas e deficiências.
O lazer também é significativo, com as cavalgadas, tão comum em muitas partes do país e também aqui em Rondônia, como também das romarias que acontecem nos mais variados rincões do Brasil.
De igual modo, o trabalho nas fazendas, apesar da evolução tecnológica, ainda usa de forma eficiente e determinante a força e a sabedoria do cavalo nas lidas diárias.
Ter um cavalo e poder usufruir do contato doce, do aprendizado contínuo com o animal, muitas vezes pode ser um sonho de uma criança, de um jovem, de um adulto, e, se concretizado, valerá a pena.
Por causa de tudo isso, um imenso mercado se formou em torno do cavalo.
E este mercado está crescendo dia após dia na região de Cerejeiras.
Uma variedade de negócios giram em torno deste animal, como os ranchos, os domadores, os veterinários, os zootecnistas – fora a indústria e comércio de insumos para o cavalo, como ração, medicamentos e arreios.
Segundo dados da Idaron, existem oficialmente 444 cavalos e 419 éguas no município de Cerejeiras. Os animais estão presentes em 327 propriedades rurais. Se considerarmos os municípios de Pimenteiras do Oeste e Corumbiara, este número é muito maior. Também existem animais não declarados no município.
Os cavalos podem ser subdividos em basicamente três tipos: o comum, também chamado de pangaré, o puro-sangue, que é o de raça, e o mestiço, chamado de meio-sangue.
Praticamente todos os animais puros-sangues são registrados, uma vez que o valor do animal depende, em grande medida, no registro feito nos órgãos representativos.
Dentre os animais puros-sangues, existem, obviamente, os machos e as fêmeas. As fêmeas têm um valor comercial muito maior que os machos – ao contrário do que acontece no gado, por exemplo. Entre os machos, ainda há outra classificação: os cavalos inteiros (não castrados), também chamados de garanhões, e os castrados.
A raça mais valiosa presente na região de Cerejeiras é o Quarto de Milha, que é registrado na Associação Brasileira de Criadores de Quarto de Milha (ABQM).
Quem quiser comprar um cavalo pangaré terá que desembolsar cerca de R$ 1.000,00. Mas quem sonha ter um animal de raça, terá que pagar a partir de R$ 15.000,00 num potro recém-desmamado.
O cavalo Holiday, por exemplo, é famoso em Cerejeiras. Ele é de propriedade do produtor Deolindo William Narciso, conhecido como William Campo Grande. Deste cavalo Quarto de Milha puro-sangue surgiu uma tropa que ajuda a melhorar a qualidade dos equinos da região. Depois, outros garanhões foram chegando ao município.
Depois de adquirido, o animal precisa ser domado. Os domadores cobram uma mensalidade a partir de R$ 350,00.
Para possuir o cavalo, adiciona-se a todo este custo uma despesa mensal por volta de R$ 600,00, que inclui pasto, ração e medicamentos.
Uma pessoa pode possuir um cavalo por dois motivos: necessidade e paixão (ou uma mistura dos dois).
O comerciante Ismar Ferreira Lima é daqueles que possuem cavalos porque são apaixonados por eles. Proprietário da Selva Motosseras, empresa que fica no centro de Cerejeiras, ele já teve vários animais. “Agora não tenho nenhum. Vendi todos”, disse, emocionado. “Mas sou apaixonado por cavalos”.
A paixão de Ismar pelo animal é antiga. Em 1986, por exemplo, ele participou de um desfile de 7 de Setembro pela escola estadual Castro Alves, em Cerejeiras. Na foto que guarda de lembrança, o cavaleiro aparece montado no alazão, segurando uma bandeira nas costas.
Tudo isso, ou seja, a paixão e a necessidade, faz girar um mercado que produz riqueza e gera emprego e renda na região de Cerejeiras.
Por exemplo, o município conta atualmente com sete ranchos dedicados ao animal.
O Rancho Porã é um exemplo da prosperidade deste mercado. Situado na saída da cidade de Cerejeiras, próximo à Cargill, o rancho é uma referência em cobertura (grosso modo, levar a égua para ser enxertada de um garanhão) e aluguel de baia (o “curral” onde os animais ficam quando não estão em atividade).
Apesar de ainda estar em processo de reforma e ampliação, o Rancho Porã já tem uma excelente estrutura, com pastagens, baias, currais e pista de laço.
O rancho é administrado pelo advogado Fernando Milani Filho e pela irmã dele, a advogada Ana Cláudia Milani e Silva, além de um funcionário que trabalha na propriedade, o Rancho Porã também conta com a contribuição profissional da dentista-pediatra Danielly Renner.
Atualmente, existem 12 cavalos na propriedade, entre animais próprios e de terceiros. “Temos um tratamento especial para os cavalos, com pastagem e ração”, diz Fernando Filho. Um domador também está atendendo no Rancho Porã, utilizando a estrutura do local para domar os animais.
O Rancho Nutrissul é especializado em vendas de potro da raça Quarto de Milha. O proprietário, Guimar dos Santos, o Doma, afirma que o rancho dele tem contribuído para a disseminação de cavalos de raça na região de Cerejeiras. “Temos cinco éguas e um garanhão aqui, que produz animais de alta qualidade”, diz Doma.
Bem aos fundos do Rancho Nutrissul, fica o Rancho do Moisés – que ainda está em construção – é focado somente em doma animal. “Domo somente cavalos. Não domo burros e mulas, por exemplo”, diz o domador Moisés Coimbra.
O Rancho do Moisés fica próximo ao aeroporto, na saída para Corumbiara. Trabalhando sozinho, ele consegue domar de oito a dez animais simultaneamente.
Enquanto cavalgada uma égua malhada em seu rancho, Moisés explica o mercado de doma na região de Cerejeiras. “A exigência dos clientes aumenta a cada dia. Muitos proprietários de cavalos também estudam doma somente para acompanhar e exigir um trabalho mais bem-feito do domador”, diz Moisés.