16/04/2022 às 10h31min - Atualizada em 16/04/2022 às 10h31min

Como os produtos da região de Cerejeiras podem atingir outros mercados? Os poucos exemplos que temos já apontam o caminho

Focar apenas no mercado interno seria uma falta de estratégia para a nossa classe produtiva. Mas muita coisa precisa acontecer para que possamos vender para fora. Essa reportagem tenta ajudar

Rildo Costa

Rildo Costa

Jornalista e Publicitário

Gazeta Rondônia
O agricultor Sérgio produz peixes e criou a linguiça de tambaqui. Mas ele não tem autorização para exportar produtos alimentícios. (Foto: Rildo Costa)

Um dos aspectos mais analisados e investigados pelos empresários que pretendem direcionar seus recursos para novos empreendimentos e negócios é a logística da área produtiva em relação aos pontos mais imediatos de consumo, de modo a estabelecer uma ponte mais curta entre o produtor e consumidor.

Como já falamos outras vezes, a qualidade de um determinado produto, seu diferencial, quebra estas regras básicas, pois independentemente do local onde é produzido e da distância ou proximidade dos centros consumidores, ele será buscado, levado e consumido. Isso ocorre com aqueles produtos com diferencial de qualidade ou também muitas vezes fruto de uma estratégia de marketing muito bem dirigida.

Muitas localidades ou regiões que inicialmente são classificadas como problemáticas no tocante a logística, por um ou outro fator, rapidamente alteram totalmente este contexto, até porque tudo depende da ótica que o tema é analisado.

Por exemplo, Rondônia está a 2.200 quilômetros dos principais centros consumidores do Brasil, mas isso nunca foi impeditivo para que os produtos produzidos no Sudeste do Brasil cheguem para serem consumidos na região Norte.

Ocorre que muitas vezes não focamos no imenso potencial de consumo que temos na região e ignoramos o imenso mercado consumidor que se encontra próximo e pleno de oportunidades.

Vamos conferir a seguir alguns exemplos.

A cidade de Manaus possui 2,2 milhões de habitantes, maior que Curitiba e quase a população do Mato Grosso do Sul, que tem hoje 2,8 milhões de moradores.

O Peru, que fica a 800 quilômetros de Porto Velho, tem uma população de 33 milhões de habitantes, o que representa mais que a somatória da população de todos os estados da região Sul do Brasil: Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, que totalizam 30 milhões de consumidores.

Não se pode ainda esquecer a vizinha Bolívia, que tem 10 milhões de habitantes.

Somente estes três mercados teriam capacidade para absorver toda a produção agrícola  e industrial de Rondônia, o que nos qualifica como excelente local para novos e audaciosos investimentos.

Poderíamos exportar produtos lácteos, carnes de gado, frango e suínos, embutidos, grãos, moveis, peixes, ovos, café, frutas e uma infinidade de produtos industrializados, sendo para isto necessário a quebra de barreiras burocráticas e alfandegárias.

Neste panorama do próximo futuro, os produtos do Sudeste não poderiam concorrer com os nossos, pois estariam mais de 2.500 quilômetros do mercado consumidor.

Tudo é, portanto, uma forma de analisar o mercado e direcionar as alternativas de exploração e desenvolvimento.

Mas, ao olhar para os agentes produtivos internos, ainda existe um nível elevado de timidez em pelo menos sonhar atingir estes mercados com seus produtos – embora já tenhamos exemplos positivos.

O cuteleiro Israel Silva, de Colorado, por exemplo, fabrica umas facas que são consideradas artigos de colecionador.

Com facas que vão de R$ 250 a R$ 750, o cuteleiro coloradense afirma que hoje a maioria dos clientes que ele atende com o cobiçado produto fica fora de Rondônia. “Já atendi até cliente de Portugal”, diz. “Entregamos no Brasil inteiro por meio dos correios ou por transportadoras”, afirma o microempreendedor, que deixa muito claro uma mensagem na placa que deixa na banca em feiras de exposição em que participa na região: “Entregamos para todo o Brasil”.

Ao ser perguntado sobre seus planos de exportação, ele afirma que esse é um dos sonhos que carrega. “A cutelaria brasileira é venerada no mundo inteiro. Seria muito bom ganhar clientes no mercado internacional”, diz.

O também coloradense Sérgio Yassuo, que tem uma agroindústria em Colorado do Oeste, também fabrica produtos que poderiam alcançar outros mercados. O agricultor fabrica iogurte, doce de leite, queijo minas padrão (que é uma referência), pescados e agora lançou um novo produto: a linguiça de tambaqui.

Apesar de ter produtos de excelente qualidade, o agricultor explicou que exportar será um desafio que ainda não será possível. “Alimentos frescos como o meu é diferente. Eu não tenho selo de autorização para isso. Existem três selos para as agroindústrias: o municipal, o estadual e o federal.

Uma agroindústria que tem somente o selo estadual pode fornecer o produto só para aquele determinado município. E tirar o selo federal é um nível de exigência muito difícil de atender”, disse.

Conforme explicou, o máximo que o agricultor busca atingir com os produtos de elevada qualidade que ele fabrica é a região do Cone Sul de Rondônia. “As prefeituras estão se unindo para fazer um intercâmbio de comercio das agroindústrias entre os municípios. Esperamos que essa autorização seja aprovada logo pelos respectivos gestores municipais”, explica.

Casal de agricultores fabricam doces de leite em Cerejeiras. Apesar da fama do produto, eles não conseguem vender para fora. (Foto: Rildo Costa)

Casal de agricultores fabricam doces de leite em Cerejeiras. Apesar da fama do produto, eles não conseguem vender para fora. (Foto: Rildo Costa)

O casal de agricultores José Carlos Miranda e Rosa Miranda são, por assim dizer, especialistas em doce de leite.

Os produtos deles, que incluem doces em calda, em flocos e até em casquinha (como de sorvete) são vendidos na região de Cerejeiras. No entanto, há relatos de moradores de Minas Gerais e do Paraná que já mandaram conhecidos levar os saborosos doces do casal de agricultores, que mora na Linha 4, em Cerejeiras.

Um produto desses poderia muito bem ganhar um mercado maior.

Mas, em resposta a este colunista, o agricultor explicou que não conta com mão de obra suficiente para produzir doces para atender pedidos para atender outros mercados. “A mão de obra no campo é muito difícil. Por isso, acho melhor produzir para atender só o mercado local mesmo”, diz o agricultor.

No entanto, assim como o exemplo do agricultor Sérgio Yassuo, de Colorado, os doces de leite do casal de agricultores de Cerejeiras também encontram uma série de restrições para serem exportados, pois são produtos alimentícios.

É importante dizer que alguns produtos da região de Cerejeiras já ganharam outros mercados – alguns até o exterior.

A fábrica de tacos Viacelli e a indústria de lingerie Nativa atende clientes de todo o estado de Rondônia – e até de outros estados.

O milho e a soja, além do gado, ou seja, as commodities agrícolas, como já é sabido, atingem todos os anos o mercado exterior, sendo exportadas para a Europa e Ásia. Contudo, convém ressaltar, com certo lamento, que essas commodities ganham o mercado externo quase sem nenhuma agregação de valor. Ou seja, o produto é enviado in natura, fazendo jus ao nome que carrega: commodity.

As oportunidades de mudar este quadro existem.

É preciso que as lideranças locais enxerguem o mercado externo como ele realmente é: um espaço aberto que tem uma tremenda fome por todos os tipos de produtos que já são produzidos na região de Cerejeiras.

É claro que exportar exige outro padrão de gestão e de apresentação destes produtos, mas o ganho compensa o custo e o resultado ressarce o risco.

Que possamos todos sonhar com essa possibilidade e procurar caminhos para realizar este sonho.

O cuteleiro Israel já exportou para Portugal. Mas sua oficina em Colorado pode atender clientes do mundo todo. (Foto: Rildo Costa)

O cuteleiro Israel já exportou para Portugal. Mas sua oficina em Colorado pode atender clientes do mundo todo. (Foto: Rildo Costa)


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